quinta-feira, 19 de agosto de 2010

SOU-ME TODAVIA


Conquanto ser-me-ia aquilo que queria,
ainda não irei por me ser de cor cinzenta,
posto que, de fato, não sou mais-valia,
sou-me aqui um quarto em parte macilenta,
quando não, venho a ser ulcerada ufania
e adentro quinquilharias pouco lamacentas,
em mim soterro o reto à tudo que desvia-
me e me arranca, da vida, a placenta.
E o que me ser-me-ia em si se foi baldado
no cio da cotovia que assovia o que éramos,
feito formalmente ponto malogrado
que sutil se descansa dentro em féretro:
um, feito tudo que se pode ser parto,
outro, feito tudo que se pode ser pérfido.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Ó NOITE



Encosta, ó noite aveludada de ânsias,
Tua cabeça humanamente moribunda
Em minha espádua singela por ti,
Nesta noite que só tu és:
De breu, nódoas passadas, jazigos
Abertos ao refletido mar, romances
Incompletos e de silenciosa anistia
Às desventuras maldormidas.

Faz-se assim, noite medieval,
Faz-se vir a mim, de propósito
E no propósito do arrebol
Pintado às mãos angelicais.
Vem até mim e põe término a esta
Estória diurna (não comovente)
E de migalhas convalescentes.

Petrificai, peja noite, reminiscências suas
Nas minhas edificações rústicas, sem exceções
Dos olhos lacrimosos por cores estrangeiras,
Ao modo europeu; por vidas de tanta
Veemência, que lânguidas se desmaiam;
Por sinas de aventureiros.

Vem noite!
Esfacela-se, de toda, ao meu chão
De viços teus,
Às minhas teses e conclusões.

Sejas minha cartomante e me revele
Por que choras tu, sonolenta vaidosa:
”Choro por aqui, ah sim, pois, se não sabes,
Meu fim é intrínseco ao porvir.
Espere o canto do galo de ornamentadas cristas
E assim, aos montes, irei esvair”
Amanhecerei sem ti.
Anderson Costa

terça-feira, 3 de agosto de 2010

SOU




Sou isso como sou aquilo.
Apenas tento, mas eis que não
Sou Febo ou Apolo.
Não me digam que não tento à quilo.

Sou erradio, por vezes evadido
A qualquer que é aglomerado.
Ao perceber-me que não sou
O tempo, mas tão-somente:
-Sujeira num umbigo-

Mas ser ou não ser nem traça questão,
Desde então, nem Pérsefone quer ser,
Sobretudo ao ver-se Carontiana
Em velha nau, de hoje então.

E o ser é tudo que não sou
Sobre píncaros. Sou às maneiras,
De vontades nos Arquétipos, breve
Transgressão e uma só indecisão: e/ou.

Só que não sou tamanho em Acrópole
E robusto qual Hércules. Ou apenas
Douto, uma haste torta, algo
Entre estampidos, do mundo: uma prótese.

Um lampejo a ser tão rápido,
Instantaneidades, logo passo,
Logo passa, e ficamos
Não adequados: sóis tudo que é tácito.
Anderson Costa 30.07.2010

quarta-feira, 28 de julho de 2010

QUEM ME DERA...



Quem me dera fosse um vendedor de sonhos: vendê-los-ia aos inexpressivos.
Quem me dera fosse uma torrente bravia: lavaria a toda esta circunferência conspurcada.
Quem me dera fosse um vendedor do meio-termo; pô-lo em balanças
Com o escopo do equilíbrio entre a ojeriza e o deleite.
Quem me dera...
Quem me dera fosse um noctâmbulo no percurso dos dias vetustos, dos dias corruptos,
Dos dias abruptos. Quem me dera fosse o início e o fim de algo qualquer,
Sendo as vísceras apenas um oco imaturo; ou feixes escuros e turvos.
Quem me dera fosse acalentado por espáduas femininas ao invés deste formato
Irregular que nos consome massificamente.
Quem me dera...
Quem me dera pudesse transformar toda esta concretidão visível, arrancar fora a fome esgarçada
Nas têmporas infantis; pintar, multicoloridamente, todo este ar teso-cineriforme.
Quem me dera...
Quem me dera fosse o progresso, rente a este retrocesso caudaloso,
Rente a este antagonismo superficial, rente a este vão-material.
Ah, deveras, quem me dera...
Anderson Costa



quinta-feira, 8 de julho de 2010

HOJE APRENDI UM POUCO


Hoje aprendi um pouco do bê-á-bá
Proveniente de uma vertical enseada
Na véspera do meu enterro,
Em naus: só fuligens!
Vi que as lembranças não me deixam
Melisma: apenas praxe!
E só o fato de desconhecer não enseja
A santidade, na base de algo que qualquer é.
De qualquer jazigo se apercebe a superioridade.
Um cheiro, um aroma sarcástico, vejo,
Sinto: evaporo!
E a noite se faz perfume feminino
Neste quarto em negrume, a voar estrumes,
Tombos e cotidianos: tudo fenecido!
Afundo-me na movediça mesa, alagada de mim,
E não acho solilóquios, apenas ladainhas recortadas
E anúncios comerciais.
Caem partes despedaçadas e se incrustam em sacos,
Em vácuos, em molduras de retratos.
Não vejo mais em espelhos toda a insanidade adjacente,
E ainda procuro o coaxar de intumescências:
Sinas nas paredes, marcas passadas, sujeira resvalada!
Uma ânsia de se jogar rente à clandestinidade das esquinas,
Prever todo o ardor: em quê?
Na avenida em pedregulhos, acampar sob todas
As bimbalhadas dadas às dezesseis horas.
Afaga-se o eriçado, ignomínias interpeladas,
Tragos de cigarros indecisos e mesmo assim
Ainda não sei o que fazer.
Anderson Costa

segunda-feira, 5 de julho de 2010

SÍNTESE



Na síntese em alguém escondo todos os desdobramentos
Do passado que me atormenta e faz vir à tona
Escumas em espinhos, ferindo-me,
Deteriorando o efêmero que há pouco regozijei.
Por isso, pergunto-me:
-não sei esconder minha indignação.
Como esconderei todo o meu ser em putrefação
Perante a estas milhares de vozes fantasmagóricas,
Sorrisos inexpressivos, cochichos, paradoxos de
Que ainda não necessito?
Pergunto-me e me sustenho sem alguma resposta,
Na exasperação do sentimentalismo sensacionalista presos
Aos meus calcanhares, sugando toda a sequidão
Que aflora em minha face, graças àquele homem que se diz
Homem, mas o vejo apenas como antanho,
No vazio sibilo da segregação.
E ainda há insistências brandas, vitórias, glórias,
Pessoas soberbas e tudo não passa de merda.
E tudo não passa de acomodação, fétidas bagagens
Em todo este quadradismo que canta refrões
De excrementos e deleita todas as improficuidades.
Anderson Costa

sábado, 3 de julho de 2010


VIAGEM

Transcorri o mar.
Durante todo o percurso não procurei
Achar o balanço do insano amor.
Transcorri o mar sem o propósito do amor,
Todavia com o escopo do não chegar,
Em circunscrições do desvestimento
E das ornadas noites que
Não se deixa dormir,
Sonhar amores.
A travessia pelo mar encantou
Demasiadas nostalgias
Sentadas nas cadeiras do Ferry-Boat.
E navegando fomos,
Em direção ao Cujupe,
E eu, talvez só eu,
Naveguei em outra direção,
Até sem direção,
Em ondas quietas dos ares
Que há tempo não sentia, se quer
Os teriam embotelhados para mim,
Neste meu ser que embotelhado já é.
Sobre o mar íamos.
E as ruas que conheço já se esqueciam
Em reciprocidade comutativa a
Remover toda a estrutura fincada, fixa,
Alavancando um melisma enjoativo
Nas vísceras de Junho.
E sobre o mar fomos,
Tentando encontrar intumescências
Nos Guarás.
E fomos sobre o mar.
Anderson Costa